quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

A CPT da Prelazia de Lábrea – AM, 26 anos de luta e compromisso

“Respondendo ao clamor que vem dos rios, campos e florestas”

         Desde que a CPT foi criada na Prelazia de Lábrea por decisão de uma assembléia diocesana no ano de 1984, não parou de defender a vida ameaçada nesta região sul do estado do Amazonas, estando sempre ao lado dos ribeirinhos, agricultores, pescadores e outras populações tradicionais que povoam a região. Atualmente a CPT da Prelazia de Lábrea está formada por quatro equipes, uma em cada um dos quatro municípios que formam a Prelazia (Tapauá, Canutama, Lábrea e Pauiní) com um total de seis agentes liberados e quatorze voluntários, mais um coordenador da área. As equipes se reunem duas vezes por ano, não é possível mais pelas grandes distâncias, uma no final do ano para avaliar e programar a vida das equipes e suas atividades, e outra na metade do ano para um encontro de formação.
       Os desafios que enfrentamos são muitos. Lábrea se encontra no Sul do Estado do Amazonas no chamado arco de fogo da grilagem e do desmatamento. Muito do trabalho realizado pelas nossas equipes nos últimos anos foi precisamente lutar junto a outras entidades da região para impedir o avanço da grilagem, do desmatamento, do agronegócio que ameaça a supervivência das populações tradicionais da região (ribeirinhos, indígenas, extrativistas, pescadores). Uma das bandeiras de luta para tentar frear toda esta invasão depredadora, foi o apoio incondicional às comunidades ribeirinhas do Médio Purus e do rio Ituxi para que o Governo Federal decretasse a criação de duas Reservas Extrativistas.
       Foram muitos os dias passados pelos agentes da CPT navegando pelo rio Purus e Ituxi, de barco e de “voadeira”, enfrentando o calor e a chuva, indo ao encontro das comunidades ribeirinhas levando formação e informação aos membros das comunidades sobre os benefícios que a criação das Resex trariam para toda a população. Também dedicamos muito tempo na organização e articulação social das comunidades, ajudando-as a criar associações comunitárias. Não foi fácil este trabalho, pois ao mesmo tempo em que nós levávamos essa formação e conscientização às comunidades, os políticos locais junto aos descendentes dos velhos “coronéis de barranco”, antigos proprietários de seringais e castanhais, que sempre exploraram estas populações, vendo ameaçado seu poder econômico, manipulador e dominador com a criação das Resex, faziam suas visitas às mesmas comunidades desacreditando o nosso trabalho, comprando o povo e fazendo a cabeça deles para que desistissem da luta em favor da criação das Resex.
        Pelo fato de serem enormes as distâncias na nossa região, só em Lábrea para chegar até a última comunidade do município temos que navegar quatro dias de barco sem parar, cada visita das equipes às comunidades varia entre dez a quinze dias navegando pelos rios, sem voltar a casa.
        Além de todo este trabalho em favor da criação das Resex, a CPT de Lábrea está fazendo todo um trabalho na área de preservação de lagos e tabuleiros, impedindo a pesca predatória e a caça indiscriminada de quelônios (tracajá, tartaruga...) por parte de pescadores vindos de fora do município. Para a realização deste trabalho de preservação, a CPT em parceria com o IBAMA formou e acompanha mais de 50 Agentes Ambientais Voluntários que em suas respectivas comunidades realizam um trabalho de monitoramento das áreas preservadas. A preservação de lagos e tabuleiros (praia de rio onde os quelônios criam) são fundamentais para garantir a alimentação destas populações ribeirinhas, pois a mata, os lagos e rios são o supermercado natural destas comunidades.
        Na época do verão em todas as comunidades ribeirinhas se cultiva o chamado feijão de praia, quando os rios baixam e deixam nas suas margens grandes praias adubadas de maneira natural com os nutrientes que deixam as águas durante o inverno. Este feijão além de ser junto com a farinha de mandioca alimentos básicos da população é também uma fonte de renda para a precária economia destas comunidades. Normalmente quem compra este feijão são os atravessadores (comerciantes fluviais ou regatões, como costumam chamar por estas terras). Estes comerciantes compram o feijão através do sistema de troca com mercadoria que levam da cidade. Normalmente compram a um preço muito baixo, que não compensa o trabalho dos agricultores. Por isso uma das iniciativas da CPT foi entrar em contato com a CONAB para que estas comunidades se pudessem beneficiar do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e assim vender o feijão a um preço mais justo.
          Todo o ano em cada um dos quatro municípios se celebra a Romaria da Terra e das águas (não é possível fazer uma romaria única na Prelazia por causa das distâncias) onde em um ambiente de oração, festa e amizade agradecemos a Deus pelo dom desta maravilhosa natureza que nos rodeia, celebramos as conquistas que vamos conseguindo em favor de uma vida mais digna e reivindicamos das autoridades competentes maior respeito e atenção aos direitos das comunidades na área das políticas publicas, saúde, educação....
         No ano de 2008 em que as Resex foram decretadas, celebramos esta vitoria na romaria da terra com o lema “RESEX MEDIO PURUS E ITUXI, UMA ESCOLHA PELA VIDA”
         Neste mesmo ano de 2008 no município de Canutama foi celebrada a Romaria com o lema: “TERRA E ÁGUA FONTE DE VIDA, DIREITO DE TODOS”
           O ano passado celebramos em toda a Prelazia os 25 anos de criação da CPT, por isso o tema comum das romarias foi:

“CPT- LÁBREA, 25 ANOS DE LUTA E COMPROMISSO: RESPONDENDO AO CLAMOR QUE VEM DOS RIOS CAMPOS E FLORESTAS”.

            Espero que esta breve partilha sobre a vida e compromisso das equipes da CPT que caminham ao lado dos Povos da Floresta (camponeses/as, ribeirinhos/as, pescadores/as) neste Sul do Estado do Amazonas no município de Lábrea, tenha ajudado a compreender um pouco melhor esta nossa particular realidade Amazônica.

Pe Fernando Redondo Pavón

Coordenador CPT-Prelazia de Lábrea












domingo, 19 de dezembro de 2010

Boas Práticas da Castanha na comunidade Porongaba, dentro da Resex Médio Purus

Lábrea, dezembro de 2010

Subimos o Purus na última segunda-feira, dia 13 de dezembro numa longa viagem pela Resex (foram 12 horas seguidas no motor 40 hp) até a comunidade Porongaba, que sediou a derradeira atividade da agenda programada pelo coletivo que foi uma Oficina de Boas Práticas da Castanha dentro da Reserva Extrativista do Médio Purus. Agenda considerada "estruturante" já que desde a decadência da borracha e do seringalismo na década de 60 a castanha passou a ganhar importância  econômica como a principal atividade extrativista movimentando a economia da floresta. O sistema do "patrão-freguês" infelizmente não cessou, e mesmo com a criação da RESEX , há dois anos, nos deparamos com relatos de uma situação de trabalho degradante e semi escravo onde os comunitários do antigo seringal Luzitânia (comunidades Santa Cruz e Luzitânia) entregam sua castanha pela metade do preço praticado mesmo pelos regatões que transitam no Purus. Esses comunitários denunciam que são coagidos a entregar a castanha para o "dono" do seringal não recebendo pagamento sequer para o serviço de estiva (transporte se sacas 60 kilos de castanha nas costas) do castanhal ao barco no porto da comunidade, também não recebem alimentação nem qualquer assistência. As condições de saúde são precárias, a malária é comum. Sobre a Cooperativa pouco houviram falar , cooperativismo e associativismo, conceitos ainda pouco assimilados, mas que também foram tratados nessa oficina.



Salvo esse lamentável relato que ocorre no seringal Lusitânia, a oficina transcorreu bem, comandada pelo técnico do IDAM Valdeson Vilaça, com o apoio do agente da CPT, Queops Silva e da equipe do IEB. Uma rica troca de experiência entre o conhecimento técnico e os saberes tradicionais, tanto no momento teórico como na prática envolveu a todo o grupo que com muito bom humor se reuniu para pensar os próximos passos de modo a se organizarem em associações e vender para a cooperativa local, a COOPMAS.
Importantíssimo também ressaltar a participação da ATAMP, associação da RESEX representada pelo seu secretário José Maria, que juntamente com a COOPMAS, representada pelo Sr. Raimundo fecharam um acordo para passar a comprar a castanha da população desse setor da RESEX. A apresentação do Sr. Raimundo da Cooperativa mostrando fotos das máquinas de beneficiamento e o valor que pode chegar o produto quando atinge o mercado muito animou os castanheiros presentes que se motivaram a se filiarem a COOPMAS, pedindo entretanto o apoio ao IEB para futuras capacitações em cooperativismo e associativismo.

                                                              
                        por Marcelo Horta Messias Franco do escritório do IEB em Lábrea