Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo
foi à Boca do Acre discutir e buscar soluções para os conflitos de terra no sul
do Amazonas
Por Maria Emília Coelho, assessora de comunicação do Programa Sul do Amazonas
“Quando cheguei em casa a
primeira coisa que encontrei embaixo da minha porta foi um bilhete com a frase:
eu vou te matar”. No dia 26 de setembro, durante a 383ª reunião da Comissão
Nacional de Combate à Violência no Campo (CNVC), no município de Boca do Acre,
o produtor rural e extrativista José Everaldo Vieira Melo fez um dramático relato
que revela a violenta realidade vivida pelas lideranças comunitárias juradas de
morte no sul do Amazonas.
O objetivo da audiência
pública da CNVC foi reunir a sociedade civil e os órgãos governamentais para discutir
e buscar soluções para os conflitos de terra dessa região amazônica cada vez
mais pressionada pelo chamado Arco do Desmatamento. Os pequenos agricultores,
extrativistas, e indígenas sofrem constantemente ameaças e agressões por
denunciarem madeireiros ilegais, grileiros, e fazendeiros.
“A ausência do Estado é
uma das causas dos conflitos agrários no meio rural”, disse o diretor
operacional da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Acre, Alberto
Paixão. O promotor de justiça de Boca do Acre, Armando Gurgel Maia, também
culpou o governo federal pelo desmatamento e crimes ambientais que ocorrem na
região citando o caso do Projeto de Assentamento Monte, localizado em Boca do
Acre e Lábrea.
“São assentamentos sem um
mínimo de estrutura para se viver dignamente, não há saneamento básico. Essas
pessoas acabam abandonadas no Monte. Endividadas, perdem suas terras. O lugar é
inóspito e refugio de vários assassinos com 2,3,10 homicídios. Um lugar com
alta violência no campo”, discursou indignado o promotor de Boca do Acre.
A representante do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS), Luzia Santos da Silva, entregou
aos membros da comissão o relatório intitulado “Conflitos Fundiários, Violência
e Ameaça os Direitos Humanos no Sul do Amazonas”, e denunciou os pecuaristas
que estão se apossando de terras públicas na região de Boca do Acre, município
com o maior rebanho de gado de corte do Amazonas.
Seringal Macapá
“Estamos
lutando dia após dia, não queremos nada de ninguém, só um pedaço de terra para
trabalhar e criar a família com dignidade. Ninguém quer terra para desmatar e
virar fazendeiro, queremos um projeto de agroextrativismo. Queremos viver na
floresta, explicou José Everaldo Melo, que é presidente da Associação de
Produtores e Produtoras Rurais Agroextrativistas do Seringal Macapá (APRACEMA).
Segundo o Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a área do Seringal Macapá
está sobreposta a um título de propriedade denominado Granada, ocupado pela Fazenda Caçula, do pecuarista
Juarez Carlos Brasileiro. Em julho de 2009, uma ação de despejo removeu as
105 famílias que vivem no lugar. Todos tiveram que sair com a roupa do corpo.
Cinco dias depois, quando voltaram ao assentamento, encontrarem suas casas e
pertences queimados.
As cerca de 30 famílias do
Seringal Macapá, que ocupavam as cadeiras do galpão da Paróquia de São Pedro
Apóstolo na audiência pública da CNCV, reivindicam a desapropriação da área e sua destinação para regularização fundiária pelo
Programa Terra Legal.
O Procurador Regional da
República, José Elaeres Teixeira, sugeriu o agendamento de uma reunião extraordinária
da comissão em Manaus para se esclarecer exatamente qual é a real situação
fundiária dessa área: “A gente vê aqui um desencontro de informações entre os
órgãos. Qual o encaminhamento que deve ser dado para esses trabalhadores rurais
regularizarem suas terras? Da forma como está não vislumbro nenhum tipo de
solução”.
O presidente da CNVC, o
ouvidor agrário nacional Gercino José da Silva Filho, comprometeu-se solicitar
a inclusão do José Everaldo no Programa
de Defesa de Defensores de Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos e
Minorias da Presidência da República (SDHM).
Gleba Água azul
Maurício Arza Gualasua é outro camponês ameaçado de morte na
região do Sul do Amazonas. Ele é presidente da Associação dos Pequenos Produtores
e Criadores Rio Azul (ASPECRA), criada
em junho de 2010 para representar as 68 famílias que lutam pela reforma
agrária do imóvel da fazenda Presidente Prudente, área pública denominada gleba
Água Azul, no município de Canutama, KM 22 da BR-319.
Em
dezembro de 2010, os fazendeiros Iris
Fátima Pandovani de Andrade e seu esposo Wilson Garcia de Andrade contrataram policiais para perseguir os agricultores
com ações criminosas como envenenamento dos roçados, incêndios de casas e
ameaças de mortes. O crime foi denunciado pela comunidade e o reconhecimento
dos suspeitos foi feito. Os 14 policiais militares ambientais de Rondônia
se encontram presos hoje, mas os dois pretensos proprietários da área estão foragidos
há mais de um mês.
Enquanto o caso segue na
Justiça, uma viatura da Polícia Militar de Canutama ronda a área do Rio Azul
duas vezes por semana com combustível comprado pela comunidade: “Durante a
noite os cachorros latem e a gente se levanta. Já falei pro delegado sobre os doidos
que estão indo lá atirar na beira do acampamento. Vai criando aquela tensão. As
ameaças contra a minha vida continuam e eu continuo morando na área”, disse
Maurício, que desde 2011 pede para ser incluído no Programa de Defesa da SDHM,
mas ainda não foi atendido.
Segundo o relatório
Conflitos no Campo Brasil 2011, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lançado em
maio deste ano, em todo o Brasil, o número de ameaçados em disputas fundiárias
avançou 177%. São 347 pessoas juradas de
morte em 18 estados brasileiros. A maioria são indígenas, quilombolas,
ribeirinhos, assentados, posseiros, pequenos agricultores, ou pessoas que
apoiam suas lutas em defesa dos seus territórios.
De acordo com a CPT, o
número de ameaçados no Amazonas cresceu 60% em 2011. Ao todo, 40 pessoas estão
em risco de vida por causa de conflitos agrários, sendo 17 em municípios do Sul
do estado. Em 2010, o número de ameaçados era 30. Sem contar os casos de conflitos e violência que ocorrem e
não são devidamente notificados junto às autoridades oficiais. Desde
2007, ao menos oito pessoas foram mortas por denunciarem os crimes ambientais e
de propriedade da terra no Sul do Amazonas.
Um comentário:
Olá, Meu nome é Vandré Fonseca, sou repórter em Manaus, e gostaria de entrar em contato com vc, para conhecer melhor o programa que desenvolvem.
Gostaria de um e-mail ou telefone para fazer o contato:
vandrefonseca@gmail.com
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